1. Exército na rua. Não sei porquê, nas ruas da Cidade do México veêm-se camiões carregados de soldados. Até vi tanques no meio do tráfico, (penso que) devido ao dia da Independência que se aproxima...
2. Cor. Apesar do caos, a Cidade do México pareceu-me insolitamente colorida, tipo manta de retalhos feita de tecidos velhos e fortes. A cor estava também nas faces das mexicanas, que se maquilham artisticamente. No Museu de Antropologia percebi que a tradição garrida vem de longe: as ruínas Aztecas são fortemente coloridas.
3. Milho. O milho está para o México como o trigo está para Portugal, que é como quem diz, o pão mexicano é a tortilha. E a palavra portuguesa sandes deve ter a traduação de quesadilha. O culto do milho vem de longe, desde os povos ameríndios.
4. Alegria. (tomem em conta o exagero de uma turista que esteve no México menos de meio mês). Parece-me que a cultura mexicana pende para a alegria como a portuguesa pende para a tristeza e seriedade. Posso não perceber as letras de músicas tradicionais, mas parece-me tudo alegre (de mariachis aos ritmos latinos mais conhecidos). No meio de um cemitério mexicano vi uma pepsi aberta perto de uma campa (é tradição celebrar a morte de um ente querido com ofertas). Foi-me um bocado difícil entender isto. Não é que não se esteja triste ou menos feliz, é como se a resposta adquirida às situações experenciadas fosse a alegria e a leveza. É um bocado esquisito, é como se se os pequenos dramas da vida não existissem e se dissipassem em risadas... (E para os grandes existe pepsi.)
5. Política no feminino. Acabaram de haver eleições municipais (?) no México, e portanto havia uma data de cartazes políticos espalhados pela cidade. Epá, e tive uma sensação estranha: havia imensas mulheres a concorrer, quase tantas como homens. Não sei como explicar esta sensação de paridade num país onde viver é difícil e mais se se fôr mulher.
6. Dança. Fui ao teatro ver danças mexicanas (não sei que nome dar a esta mezcla de flamengo com cor, alegria e cultura ameríndia, por isso chamo danças mexicanas. No México chama-se Ballet Folclórico Amália Hernandez). Parece-me que foi a experiência de dança mais intensa que tive até hoje. Adorei. As danças simbolizavam partes da história do México (desde os aztecas, até a danças de casamento e baile, passando pela revolução e uma dança simbolizando a caça de um veado). Eram feitas de vitalidade, força, e alegria. As cores e os trajes mexicanos também dançavam, e às vezes viam-se figuras de borboletas feitas de tecido no palco. Era tudo simples e forte e bonito, e a música punha-nos um sorriso nos lábios.
7. Borboletas no topo da pirâmide do Sol, em Teotihuacan (era o Amor...).
quarta-feira, 26 de agosto de 2009
domingo, 16 de agosto de 2009
Viva México
Ainda leêm este blog?
Ou estará este blog já irremediavelmente perdido na imensidão da internet?
Este post agora não é sobre os US, é sobre o México.
É verdade, vim à Cidade do México. Duas vezes este Verão. Fui às pirâmides, andei na baixa, andei de metro, andei de carro pelos subúrbios, fui ao cinema, fui ao museu e à universidade (UNAM) mais prestigiada do México (assim me dizem, pelo menos). Ah, e provei a comida mexicana, gafanhotos (dois), ovos de formiga, larvas do cacto que dá tequillas, fruta selvagem de cacto (tuna) e outra fruta cor de rosa exótica cujo nome não me lembro. E claro, salsas, guacamole, quesadillas.
Nem sei por onde começar.
A comida é óptima. Adorei. Amei. A comida mexicana combina os meus ingredientes favoritos da portuguesa (alho, coentros,tomate, ervas) com uma herança exótica Azteca.
Existem vendedores ambulante de todo o tipo nas estradas. Vendem tunas, milho cozido com chili, frutas, gelados (bulubulu?), tamale. Mas, numa cidade onde a água da torneira não é potável, confesso que não me aventurei muito por este tipo de snacks.
A herança ameríndia está por todo o lado. Nos nomes das ruas, com muitos tês e éles, emigrados da língua Nahuatl. No Xamã que encontrei na praça principal da cidade do México. Mas, sobretudo, nas pessoas. A maior parte das pessoas tem fisionimia índia. Pequenos, morenos, e com maçãs do rosto salientes.
(Nota: não percebo muito bem porque é que no Brasil não se veêm tantos índios - ou pelo menos quem lá esteve disse-me que a fisionomia das pessoas está entre o caucasiano e o mulato. Não sei se isto não contradirá a "conveniente" teoria lusa que os portugueses foram muito menos agressivos que os espanhóis com os povos nativos.)
Quinhentos anos depois da "Conquista" os índios são os pobres, os brancos são os ricos. Num dos bairros mais ricos da cidade, só vi brancos. Nos subúrbios da Cidade do México só vi índios.
A cidade do México tem vinte e dois milhões de pessoas. Isso é duas vezes a população do nosso país. Não é uma cidade bonita como Paris ou ordenada. É uma cidade colorida e caótica, feita de casas encavalitadas em cima de casas. De favelas em cima de favelas. O centro da cidade tem um toque hispânico evidente, construído em cima de pirâmides aztecas, um centro financeiro feito de arranha-céus, jardins e edifícios altos. Mas, quando se olha de um prédio alto, casas e casas é tudo o que a vista alcança.
Os subúrbios são feitos de favelas. Casebres cinzentos que alastram pelas montanhas. O sistema de transporte público é limitado. Aqui usam-se as peseras para ir para fora da cidade. As peseras não têm "paragens", param onde lhe fazem sinal, complicando ainda mais o trânsito. Que sim, é tão complexo e feito de engarrafamentos como temos ideia.
Há sempre carros. O perto é distante e demora tempo. A condução é feita de pequenos gestos, com tantos carros colados uns aos outros. A vida complica-se com o tempo que se demora a chegar a qualquer sítio (horas).
Estar no México fez-me compreender o que é ser Europeia, Portuguesa. Adivinho que uma população equivalente à população do nosso país viva em favelas (que a mim me parecem decadentes e pobres). Parte da população sobrevive com trabalhos menores (pôr gasolina, lavar carros, vender coisas nas ruas).
A pobreza aqui é uma pobreza diferente. Não é que os pobres que vi aqui não se possam ver em Portugal. Mas o número de pobres institucionaliza a pobreza. Como europeia, vivo num país e num continente onde a pobreza revolta, onde o governo tem que resolver problemas humanitários considerados graves. Aqui, o número de pobres aliado a corrupção estatal tornam a pobreza num algo que simplesmente existe, à espera de algo.
Não me leiam mal. Sempre pensei e continuo a pensar que parte do nosso dever enquanto cidadãos do mundo rico é tentar contribuir para uma sociedade mais justa. O que acontece é que temos uma noção de direitos individuais que é insustentável a fora do mundo ocidental. Eu tenho um sentimento que alguém tem sempre que fazer algo pelos pobres porque não devem haver pobres. Aqui, é como se o peso da realidade esmagasse essa noção. Existem tantos pobres que a solução imediata, o curto ou médio prazo é quase impossível.
O longo prazo torna-se ainda mais difícil quando se pensa que a literacia aqui é frágil, a corrupção galopante e este país tem problemas de segurança gritantes.
Os raptos são uma realidade. A polícia pratica o suborno. No outro dia, no cinema vi um casal escoltado por seguranças.
Mais uma vez, não me leiam mal. Não quero transmitir uma sensação de pessimismo generalizado e desistência. É só que, muito sinceramente, só percebi agora o que é ser rico a nível global. O viver numa sociedade onde posso confiar minimamente em instituições, onde posso escolher o que estudar, onde se espera que a morte de um anónimo seja cuidada e investigada. O viver numa sociedade que tem uma das moedas mais fortes a nível mundial.
Num país onde a pobreza é endémica, e as instituições são falíveis, a acção individual solitária é um pixel branco num quadro negro. Faltam soluções facilmente escaláveis a milhões e mesmo essas demorarão gerações a darem frutos.
Falta um sentimento de igualdade social que permita que milhões de pessoas queiram e saibam construir uma sociedade mais justa. Mais uma vez, a pobreza não existe solitária. A desigualdade aqui é gritante. Aposto que a variância de preços entre produtos de pobres (muito mais baratos que no mundo ocidental) e produtos de ricos (com portáteis que aqui se vendem ao dobro do preço dos EUA, já para não falar de artigos de luxo) é muito maior que no nosso país. E, se existe mercado, existe procura...
E, apesar de tudo, na minha amostra enviesada de pessoas mexicanas que conheci, encontro uma leveza de espírito, uma alegria não amargurada que contrasta com um certo negrume lusitano. E as favelas têm enfeites de festa.
Ou estará este blog já irremediavelmente perdido na imensidão da internet?
Este post agora não é sobre os US, é sobre o México.
É verdade, vim à Cidade do México. Duas vezes este Verão. Fui às pirâmides, andei na baixa, andei de metro, andei de carro pelos subúrbios, fui ao cinema, fui ao museu e à universidade (UNAM) mais prestigiada do México (assim me dizem, pelo menos). Ah, e provei a comida mexicana, gafanhotos (dois), ovos de formiga, larvas do cacto que dá tequillas, fruta selvagem de cacto (tuna) e outra fruta cor de rosa exótica cujo nome não me lembro. E claro, salsas, guacamole, quesadillas.
Nem sei por onde começar.
A comida é óptima. Adorei. Amei. A comida mexicana combina os meus ingredientes favoritos da portuguesa (alho, coentros,tomate, ervas) com uma herança exótica Azteca.
Existem vendedores ambulante de todo o tipo nas estradas. Vendem tunas, milho cozido com chili, frutas, gelados (bulubulu?), tamale. Mas, numa cidade onde a água da torneira não é potável, confesso que não me aventurei muito por este tipo de snacks.
A herança ameríndia está por todo o lado. Nos nomes das ruas, com muitos tês e éles, emigrados da língua Nahuatl. No Xamã que encontrei na praça principal da cidade do México. Mas, sobretudo, nas pessoas. A maior parte das pessoas tem fisionimia índia. Pequenos, morenos, e com maçãs do rosto salientes.
(Nota: não percebo muito bem porque é que no Brasil não se veêm tantos índios - ou pelo menos quem lá esteve disse-me que a fisionomia das pessoas está entre o caucasiano e o mulato. Não sei se isto não contradirá a "conveniente" teoria lusa que os portugueses foram muito menos agressivos que os espanhóis com os povos nativos.)
Quinhentos anos depois da "Conquista" os índios são os pobres, os brancos são os ricos. Num dos bairros mais ricos da cidade, só vi brancos. Nos subúrbios da Cidade do México só vi índios.
A cidade do México tem vinte e dois milhões de pessoas. Isso é duas vezes a população do nosso país. Não é uma cidade bonita como Paris ou ordenada. É uma cidade colorida e caótica, feita de casas encavalitadas em cima de casas. De favelas em cima de favelas. O centro da cidade tem um toque hispânico evidente, construído em cima de pirâmides aztecas, um centro financeiro feito de arranha-céus, jardins e edifícios altos. Mas, quando se olha de um prédio alto, casas e casas é tudo o que a vista alcança.
Os subúrbios são feitos de favelas. Casebres cinzentos que alastram pelas montanhas. O sistema de transporte público é limitado. Aqui usam-se as peseras para ir para fora da cidade. As peseras não têm "paragens", param onde lhe fazem sinal, complicando ainda mais o trânsito. Que sim, é tão complexo e feito de engarrafamentos como temos ideia.
Há sempre carros. O perto é distante e demora tempo. A condução é feita de pequenos gestos, com tantos carros colados uns aos outros. A vida complica-se com o tempo que se demora a chegar a qualquer sítio (horas).
Estar no México fez-me compreender o que é ser Europeia, Portuguesa. Adivinho que uma população equivalente à população do nosso país viva em favelas (que a mim me parecem decadentes e pobres). Parte da população sobrevive com trabalhos menores (pôr gasolina, lavar carros, vender coisas nas ruas).
A pobreza aqui é uma pobreza diferente. Não é que os pobres que vi aqui não se possam ver em Portugal. Mas o número de pobres institucionaliza a pobreza. Como europeia, vivo num país e num continente onde a pobreza revolta, onde o governo tem que resolver problemas humanitários considerados graves. Aqui, o número de pobres aliado a corrupção estatal tornam a pobreza num algo que simplesmente existe, à espera de algo.
Não me leiam mal. Sempre pensei e continuo a pensar que parte do nosso dever enquanto cidadãos do mundo rico é tentar contribuir para uma sociedade mais justa. O que acontece é que temos uma noção de direitos individuais que é insustentável a fora do mundo ocidental. Eu tenho um sentimento que alguém tem sempre que fazer algo pelos pobres porque não devem haver pobres. Aqui, é como se o peso da realidade esmagasse essa noção. Existem tantos pobres que a solução imediata, o curto ou médio prazo é quase impossível.
O longo prazo torna-se ainda mais difícil quando se pensa que a literacia aqui é frágil, a corrupção galopante e este país tem problemas de segurança gritantes.
Os raptos são uma realidade. A polícia pratica o suborno. No outro dia, no cinema vi um casal escoltado por seguranças.
Mais uma vez, não me leiam mal. Não quero transmitir uma sensação de pessimismo generalizado e desistência. É só que, muito sinceramente, só percebi agora o que é ser rico a nível global. O viver numa sociedade onde posso confiar minimamente em instituições, onde posso escolher o que estudar, onde se espera que a morte de um anónimo seja cuidada e investigada. O viver numa sociedade que tem uma das moedas mais fortes a nível mundial.
Num país onde a pobreza é endémica, e as instituições são falíveis, a acção individual solitária é um pixel branco num quadro negro. Faltam soluções facilmente escaláveis a milhões e mesmo essas demorarão gerações a darem frutos.
Falta um sentimento de igualdade social que permita que milhões de pessoas queiram e saibam construir uma sociedade mais justa. Mais uma vez, a pobreza não existe solitária. A desigualdade aqui é gritante. Aposto que a variância de preços entre produtos de pobres (muito mais baratos que no mundo ocidental) e produtos de ricos (com portáteis que aqui se vendem ao dobro do preço dos EUA, já para não falar de artigos de luxo) é muito maior que no nosso país. E, se existe mercado, existe procura...
E, apesar de tudo, na minha amostra enviesada de pessoas mexicanas que conheci, encontro uma leveza de espírito, uma alegria não amargurada que contrasta com um certo negrume lusitano. E as favelas têm enfeites de festa.
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