segunda-feira, 30 de março de 2009

Europe in America

Uma das coisas que estar na América me fez é ver a Europa com outros olhos. Ou compreender que os americanos vêm a Europa com olhos americanos e não com olhos europeus.

Europa aqui é uma palavra que parece transpirar classe, antiguidade e socialismo.
Quando procurei um cabeleireiro no Verão dei por mim a ler anúncios na internet de "cabeleireiros estilo europeu". Ao que parece, são cabeleireiros com classe e cadeiras requintadas (infelizmente, esta Europa não deve ter chegado ao meu cabeleireiro do vale de santarém)...

Nas eleições, e no discurso político, a Europa é mais tratada como um pormenor do que como uma norma. Esqueçam a UN. A UN, desarmada, ainda é um pormenor mais pequenino (citação do David la chappelle a imitar o Bush, sobre a guerra do Iraque: "you know, UN, sanction me... sanction me with your army. Ooooh, you don't have an army! Then shut the f##k up! Shut the f##k up!"). Num dos debates presidenciais, um ouvinte perguntou se os EUA atacariam o Irão, se o Irão atacasse Israel, independentemente da UN. Parece-me que esta pergunta seria impensável no nosso país, ou mesmo na GB.
Mas afinal, talvez historicamente faça algum sentido... Precisamos da UN mais do que os USA precisam. A segunda GG devastou o nosso continente, não o continente americano. E talvez a alergia a ditaduras fascistas nos tenha inclinado mais para a esquerda do que os estados unidos.
Ou talvez seja o peso da história. Quase todos os países europeus tiveram o seu período dourado e a consequente decadência. Impregnado no nosso espírito (e escrito no meu espírito de tuga) está um certo odor a fado. Um certo desdém por esforços individuais, quando o destino é, por vezes, inescapável e ninguém sobrevive às voltas e desvoltas da história.

Os EUA têm um certo optimismo ingénuo, de quem quer e pode vencer todas as guerras porque até agora não perderam (quase) nenhuma. E, de facto, fazem-no e vão manter essa postura "nr.1 cops in search for profit" até serem esmagados por outra potência.
Vir aqui para os EUA também significou perceber que, apesar dos nossos trajes de hoje serem mais modernos, giros e pseudo, as nações lutam por sobrevivência e supremacia, quais tribos tecnológicas da Idade da Pedra. As armas é que mudaram. Antes era o fogo, agora são as bombas atómicas.
Entretanto, o povinho passa a vida a trabalhar e a perseguir objectivozinhos cujo valor ninguém consegue estimar.

Mas também não sei se vale muito a pena pensar nisto, porque no final, no final, o que conta é o amor e ser feliz. (Pelo menos é isso que dizem ao povinho...)

Emigrant tales

... ou os efeitos psicológicos da distância.

No ano passado, em Novembro, ouvi dizer que um colega espanhol (um rapaz que acampou comigo no Verão) estava dolorosamente acometido de dores gravíssimas. Suspeitou-se de apendicite, pedras nos rins e outras doenças que tais. Análises clínicas não acusaram nada nem ninguém. Ele suspeitou que anos recheados de aventuras alcoolicas fossem os responsáveis por tal doença anónima... Misterioso.
Há pouco tempo, soube que, voltado a Espanha e tendo ido ao médico espanhol, ele, mais uma vez, não obteve solução para o seu problema. O médico disse-lhe que era nada. De volta aos EUA, as dores não voltaram. Não é lógico, é psicológico (perdoem o clichet), segundo a pessoa que me contou isto.

Outras histórias se conhecem de emigrantes que desenvolveram alergias e problemas de pele, sentados nas cadeiras dos seus escritórios usianos. Pode ser que o ar americano seja mais propenso a isso, quem sabe... Ou talvez a ansiedade mental possa saltar para a pele.

A distância é esquisita. Não sei bem ao que sabe. Sinto-me como se os meus pais estivessem ali ao lado, e eu fosse a casa nos fins de semanas. Quando vou a casa, demoro tempo a habituar-me ao normal que já não é normal.
E o que é ainda mais estranho, é eu sentir-me estranha, numa casa que também é minha. É o ser alienígena a este país. É o estado americano me pôr em segundo lugar. Posso pensar em ficar cá, mas nada é adquirido. Tenho que arranjar permissões para tudo, e as permissões são limitadas. E dou por mim a andar pelos grandes supermercados americanos e a dar-me conta que estou na américa, estou no estrangeiro, e que ser emigrante deve ser isto: um misto de familiaridade adquirida que se entranha e se estranha ao mesmo tempo.