terça-feira, 28 de abril de 2009

The fat of the land

Ontem uma amiga do Dout. disse-me que viu uns chineses com máscara a vir para a escola. No Departamento de Engineering and Public Policy li um aviso que advertia constipados e tussidores de cuspo infectado a ficar em casa até passar a crise viral. Fizeram-me fwd de um e-mail oficial da CMU que dizia que ainda não havia casos na Pensylvannia mas que era preciso cuidado (e, já agora, informação útil, que o período de transmissão era um dia antes do infectado ficar doente e até sete dias depois).

No México morrem pessoas e os EUA os infectados continuam a crescer (agora já são cerca de 50, parece-me).

Dito isto, que a coisa parece séria, devo dizer que este clima caotico de sci-fi me irrita um bocado.
O mundo ocidental descobriu uma realidade assustadora: de repente, podemos morrer de doença, incontrolavelmente, irracionalmente, sem vacina. Nós, os inventores da ciência moderna, fomos despromovidos ao lugar que o resto do mundo ocupa. Uma criança morre de malária a cada 30 segundos (http://www.who.int/features/factfiles/malaria/en/index.html) e onde estão os seus retratos? Eles não existem. Uma multidão de bebés é menos real que a Maddie, porque a Maddie viveu numa casa como nós, era loira e adorada pelos pais. Por muitos filmes que vejamos, não conseguimos imaginar viver numa cabana, comer arroz, e ir fazer xixi ao lago. Não ter água diariamente. Não ter internet, ou facebook, ou messenger.

Uma colega minha aqui das social sciences estudou isto. A caridade e a empatia aumentam quando o espectador consegue identificar e relacionar (pelo menos emocionalmente) com a vítima. Estamos programados para pequenas calamidades, para o bebé perdido, o homem com a doença incurável, a pessoa que conhecemos ou imaginamos conhecer, mas a tragédia ilude-nos porque é abstracta e longe demais.
A não ser quando nos imaginamos como vítimas, acrescento eu (quantos oubreaks de cólera, tuberculose, maríola, não ignorámos já nós?).

Enfim, é claro que isto é um desabafo inútil (e cínico, afinal). A morte dos pobres não justifica indiferença perante a possível morte de muitos ricos, ou mesmo a morte de alguns. Mas a verdade é que a vida de ricos nos faz esquecer a morte dos pobres, todos os dias.

sábado, 18 de abril de 2009

I want my human rights (and palm trees)

Quando se abre a porta do aeroporto em Miami, a primeira coisa que se nota é o bafo quente e húmido do exterior. O aeroporto é grande e deve ter aparecido em tantos filmes que me parece um tanto ou quanto familiar. Espero pela mini-van (uma versão de táxi partilhado, mais barato que os táxis normais) e vou para o hotel. Só vai mais uma pessoa no carro. O condutor é indiano e no lugar do morto vai uma afro-americana a falar num dialecto que não consigo entender.

A seguir são as palmeiras. Há palmeiras por todo o lado.

Miami está mesmo na pontinha dos Estados Unidos. Rodeada de mar e oceano, dentro de muralhas constituídas por hoteis nas dunas, é uma cidade de prédios altos e carros caros.

Mas se de Miami vi pouco, o mar vi todos os dias. Já estava com saudades de praia, mesmo que aqui a praia não seja o monumento natural que, em Portugal, ameaça desaparecer, mas um apêndice de hoteis cinco estrelas. O hotel, por aqui, é o monumento.

(Pequena nota: com tantos hoteis não percebi como o mar podia parecer tão limpo.)

A separação de classes é evidente. Uma maioria de clientes brancos, servida por uma maioria de empregados hispânicos ou afro-americanos.

Na cidade, ouve-se falar espanhol e inglês, e por esta ordem. Fui a um aquário com vários peixinhos, tartarugas, alligators, e uns animais parecidos com focas de que não me lembro o nome. O aquário tem o ar deprimente e antiquado dos anos 70. O show de golfinhos era parecido com aquele que vi aos 10anos do zoo, mas em versão rock. (Em parte, o aquário serve de berço para algumas criaturas que tropeçam em redes e artefactos humanos e depois são libertadas. Menos mal.)
Fui a Little Havana, onde existem lojas com o sinal "se habla inglés". As casas são pequeninas e rasteiras, e as ruas largas. Parece os subúrbios de qualquer coisa. Comi no melhor restaurante de comida cubana (segundo dizem). O estilo não é surpreendente. Parece assim chique anos-50. Comprei mamey e goiaba num mercado que parecia a praça antes das remodelações. Mamey é um fruto com caroço de pêssego, que se come como uma meloa cor de rosa.
Ouvi falar de Little Haiti, onde a polícia não entra.
E que as línguas oficiais de Miami são o inglês, espanhol e, surpreendemente, o criolo do Haiti.

Gostei da praia, mas, semanas depois do ocorrido (pele caída dos escaldões e tudo), reflicto que não gostaria muito de morar aqui. Parece quente demais, húmido demais, com carros brilhantes demais, muitos hotéis e pouca maresia.

Lembram-se do Al Pacino como Tony Montana ("Scarface")? Cubano, à entrada de Miami, "he wants his human rights" (com violência, o filme vai mostrando até que ponto isto é sarcasmo). http://www.youtube.com/watch?v=ciF2CYn36gA