quarta-feira, 6 de maio de 2009

América, américa

Uma das coisas que gosto aqui da américa, é que não há só um pouco de tudo, cada pouco berra à sua maneira no espaço público, onde tudo é possível. É assim um individualismo cacofónico e colorido, tolerante e racista, com as suas armadilhas para loosers e prémios para winners, onde o mercado é rei e a pessoa "the ultimate entrepreneur".

Existem muitos heróis. Existem muitos psicopatas.
Ricos, muito ricos, pobres, e intocáveis.
E budistas reconvertidos enamorados com a New Age, accept you as you are, convivem com brutos matadores de bebés.

Não sei se isto será um resultado da lei dos grandes números. Afinal a América é mais um continente que um país.
E, entre tantos aviões, um tem que aterrar na água, fazendo do seu capitão um herói. Da mesma forma, cada geração tem o seu provável número de psicopatas. Num mercado de milhões, uns têm que enriquecer de uma maneira estatísticamente improvável, ao mesmo tempo que outros empobrevem.
Muitas destas improbabilidades estão na origem de grandes empreendimentos americanos. No século XIX Edison e Bell fundaram empresas que se tornariam na General Electric, onde Langmuir trabalhou e receberia o Nobel nos anos 20, e a AT&T, onde o transístor seria inventado nos anos 50 (o mesmo transístor que deu origem à indústria dos semi-condutores, Sillicon Valley, e ao PC, por onde a internet circula). A indústria automóvel americana, agora em declínio, começou com um punhado de empresas, de onde todos os outros fundadores de companhias de sucesso descenderiam.
(Uma breve nota: uma das melhores coisas em trabalhar em organização industrial em geral, e com o meu advisor em particular, é traçar as histórias de indústrias e eteceteras a alguns génios improváveis).

Por outro lado, esta cacofonia individualista pode ser explicada através dos mitos fundadores da américa. Com a boston tea party e tipos a fugir aos impostos, tentando fundar algo não supervisionado por um governo central, mas regulado pela vontade e esforço de cada um (sobretudo os mais ricos?).

Não sei, mas é interessante. Cada dia há escândalos sui-generis, com adeptos fervorosos dos dois lados. O último envolve uma miss e um juiz gay. O juiz perguntou à miss se concordava com o casamento de homossexuais, e ela disse que, desculpem, mas não senhora. Enquanto o juiz começou a colocar no blog que a miss era uma praia (em americano), liberais e conservadores muito ponderam sobre a miss, que agora está a pensar seguir uma carreira em política (no kidding). É claro que isto tem como pano de fundo a ongoing discussion sobre o casamento gay, passagem e despassagem de proposições e votações, e etcs que tais, mas é sobretudo o resultado de media histéricos com vontade de coisas grandes.

E a televisão americana é ainda melhor. Volta e meia descubro pérolas televisivas. No outro dia, entre canais, descobri um padre que protestava contra a feminização da igreja, em formato talk-show e com pessoas a aplaudir. Dizia ele que os casamentos não funcionavam porque as mulheres esperavam que os homens dessem porque sim ("o que é uma coisa feminina, porque as mulheres são dadoras natas") mas isto resultava, claro está, mal, porque os homens não dão porque sim, dão porque querem alguma coisa em troca. Inclusive Deus, nunca pediu aos homens para darem sem esperar nada em troca. Infelizmente, é claro que esta argumentação caótica não sobrevive ao debate (havia um "debate" e eu esperei para ver) e o padre limitou-se a repetir a argumentação vezes sem conta.
(O padre era casado - com uma mulher que compreendia as leis da doação/retribuição masculina - por isso calculo que não fosse católico).

E agora esta última. Não sei porquê, mas no país das armas, as pessoas preocupam-se muito com casamentos. Muitos dos meus colegas de doutoramento são casados. E parece-me que o síndrome da mulher solteira é americano. Isto é, existe aqui uma classe de mulheres (mulheres, não homens, é a percepção) que quer casar, que não encontra o João Ratão, e para quem isto é muito problemático. Que algures entre o dating e o long-term relationship nunca encontrou "um homem que quisesse casar com ela" (sim, eu já ouvi esta expressão. Sad, but true.)
Não é só a questão de estar "sozinha", é, acima de tudo, um problema de identidade e validade enquanto ser humanos porque estas mulheres não se imaginam completas e dignas sem um casamento ou um homem a querer casar com elas.

Random thoughts...
E desculpem o meu português, que, não sei porquê, já me soa a esquisito.

2 comentários:

David Batista disse...

pelo que contas, os UÉSSEÁ parecem a Internet personificada :)

Comentários à parte, gosto de ler o teu blog! sério, gosto mesmo!

É mesmo verdade que na cantina é tudo servido em plástico? Sad :\

Cris disse...

:)
Olá, sim, aqui não é só na maioria das cantinas, grande parte dos restaurantes que servem os estudantes estão virados para o take-away e portanto servem tudo em plástico. As chains como o Starbucks e afins são a mesma coisa...

No outro dia vi uma notícia sobre um puto de 12 anos que estava a tentar introduzir reciclagem nas cadeias de fast-food... (uma gotinha, claro)